sábado, 26 de setembro de 2020

Como se fossem coisas distintas

Assisti meio sem querer Ana Maria Braga no Roda Viva segunda-feira. Não sabia que ela seria entrevistada e a vida quis que eu ficasse sabendo assim em cima da hora.

Gosto da Ana Maria e teve uma época da minha vida em que eu acordava cedo para assistir ao programa dela. Só saía de casa para trabalhar depois que acabava.

Eram outros tempos, outras questões, outro país e outra economia. Uma época sem whatsapp e sem bolsonarismo, em que a gente ainda acreditava viver num estado democrático de direito. Saudades.

Dito isso, devo confessar que senti um grande desconforto vendo a entrevista, sem deixar de me admirar com a educação, finèsse e elegância da Ana Maria Braga ao responder às questões dos entrevistadores e entrevistadoras.

Em dado momento, perguntaram para ela sobre política e sobre ela estar sempre em cima do muro. Lisa como um quiabo, Ana Maria saiu-se bem respondendo "perguntas difíceis".

Um pequeno momento em que ela pareceu ter esquecido de um roteiro de media training foi em sua resposta quando questionada sobre racismo. Apesar de o que pareceu um ligeiro deslize para acessar o glossário pertinente ao assunto é possível classificar a resposta como irrepreensível.

Depois a pauta foi feminismo. Movimento das mulheres. União e Me Too.

E talvez o meu desconforto venha daí. Dessa noção de que política seja algo que se refere apenas e tão somente à questões de gestão e gerenciamento da vida e da ordem de países, estados e municípios.

Como se política fosse um termo que servisse para se referir apenas àquela parte específica dos noticiários ou dos jornais impresso e não a todo o resto. Como se política fosse apenas temas relacionados a governo, prefeitura, deputados, vereadores, senadores e por aí vai.

Então venho aqui humildemente para reafirmar o óbvio de que tudo, absolutamente tudo, é política. E quando Ana Maria Braga fala que faz entretenimento e por isso não se posiciona, ela e toda a bancada do Roda Viva ressaltam uma ideia de oposição onde não há.

Não há entretenimento isento de ponto de vista e viés ideológico de mundo. E estar em cima do muro já é um posicionamento bem do claro. Não dá para falar de combate a racismo, machismo, homofobia e gordofobia como se se fossem coisas distintas de política. Não são.

Uma outra parte do meu desconforto consegui identificar apenas no dia seguinte. Por mais que a entrevista de Ana Maria Braga tenha servido também para que ela compartilhasse ensinamentos valorosos e sabedoria de vida, não pude deixar de me sentir como se estivesse lendo um dos quadrinhos da série Confinada, do Leandro Assis e da Triscila Oliveira, mas isso eu talvez desenvolva em outro post, quem sabe?

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