sexta-feira, 26 de maio de 2017

Vozes de Mariana

Há cerca de um ano eu estava (re)ingressando na Livraria da Folha, após um período de desemprego. Na verdade, voltei a trabalhar um dia depois de o acidente de Tchernóbil completar 30 anos.

As duas coisas ficaram marcadas em mim, porque fazia pouco tempo que a Companhia das Letras havia lançado o livro “Vozes de Tchernóbil”, da jornalista ucraniana, Svetlana Aleksievitch. Por conta da efeméride o título foi um dos destaques daquela semana.

Só li trechos do “Vozes” – ainda estou esperando aquela promoção de 50% de desconto maneira para garantir meu exemplar, ou se a Companhia quiser me mandar, adoraria receber – bem como de seus dois lançamentos posteriores “A Guerra Não Tem Rosto de Mulher”, sobre a participação das mulheres na Segunda Guerra Mundial e “O Fim do Homem Soviético”, sobre os impactos do pós-queda da União Soviética.

Um dos traços da escrita de Svtelana e que provavelmente ajudou a garantir o prêmio Nobel de literatura é a polifonia, ou os inúmeros depoimentos dos envolvidos no acontecimento, que ela costura para construir sua narrativa acerca do acidente nuclear.

E foco neste livro que mal li, porque foi o que mais me veio à tona quando há duas semanas fui assistir à peça “Hotel Mariana”, ainda em cartaz no Estação Satyros (praça Roosevelt, 134) aos sábados e segundas, às 20h, e domingos, às 18h. As apresentações são R$ 30 aos sábados e domingos e gratuitas às segundas.

Com depoimentos coletados pelo dramaturgo Munir Pedrosa a montagem tem no elenco nomes como Lucy Ramos, Angela Barros, Bruno Feldman, Rita Batata, Rodrigo Caetano, entre outros.

A peça usa a técnica do teatro verbatim – que eu também não sabia o que era, mas é quando os atores, usando fones de ouvido, reproduzem os relatos gravados que escutam. Me lembrou um pouco a peça “Ao Pé do Ouvido”, que esteve em cartaz em 2015.

Estive totalmente por fora dos acontecimentos de Mariana, internado em sessões de cinema na época do desastre. E antes tudo o que eu sabia da cidade era que Elizabeth Bishop e Lota Macedo de Soares passaram algumas férias por lá. Então, agora que o desmoronamento da barragem está quase fazendo dois anos, que a irresponsabilidade virou questão da Fuvest e que a peça está em cartaz, não tem como não ficar estarrecido. Tanto com a devastação em si como com a nossa alienação – inclusive a minha – em relação aos desdobramentos do caso.

O que mais me mata é o quanto é de difícil assimilação o discurso do ativista/militante que aparece no final encerrando a peça e pensar na Samarco e no trecho de “Vozes de Tchernóbil” que reproduzo a seguir:

Assim começa a história: no ano de 1986, começam a aparecer reportagens sobre o julgamento dos acusados pela catástrofe de Tchernóbil nas primeiras páginas dos jornais soviéticos e estrangeiros.

Mas, agora, imagine um prédio de cinco andares vazio. Uma casa sem moradores, mas com objetos, mobílias e roupas — coisas que ninguém nunca mais poderá usar, porque essa casa fica em Tchernóbil. Pois é justamente numa dessas casas da cidade morta que se realiza uma pequena conferência para a imprensa, oferecida pelas pessoas encarregadas de levar a cabo o julgamento dos acusados pelo acidente atômico. Nas instâncias mais altas do poder, no Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética, considerara‑se necessário examinar as causas do delito in loco. Na própria cidade de Tchernóbil. O tribunal se constituiu no prédio da Casa da Cultura local. No banco dos réus havia seis pessoas: o diretor da central atômica, Víktor Briukhánov; o engenheiro‑chefe, Nikolai Fomín; o substituto do engenheiro‑chefe, Anatóli Diátlov; o chefe do turno, Boris Rogójkin; o chefe da seção do reator, Aleksandr Kovaliénko; e o inspetor do Serviço Estatal de Inspeção de Energia Atômica da União Soviética, Iuri Láuchkin.

Os assentos destinados ao público estavam vazios, ocupados apenas por alguns jornalistas. Aliás, já não vivia mais ninguém por lá, a cidade estava “fechada” por ser “zona de controle radiativo severo”. Não seria esse o motivo de terem‑na escolhido como local do julgamento? Quanto menos testemunhas, menor o barulho. Não havia operadores de câmera nem jornalistas estrangeiros. Decerto todos gostariam de ver no banco dos réus as dezenas de funcionários de Moscou igualmente responsáveis. E todo o estamento científico, à época do acidente, deveria ter sido obrigado a assumir as suas responsabilidades. Mas se conformaram com a “arraia‑miuda”.

Saiu a sentença: Víktor Briukhánov, Nikolai Fomín e Anatóli Diátlov receberam pena de dez anos. Para os outros, as penas foram menores. No final, Anatóli Diátlov e Iuri Láuchkin morreram em consequência da exposição às fortes radiações. O engenheiro‑chefe Nikolai Fomín enlouqueceu. Por outro lado, o diretor da central nuclear Víktor Briukhánov cumpriu toda a sentença, todos os dez anos, ao fim dos quais os seus familiares e alguns jornalistas foram recebe‑lo. O acontecimento passou despercebido. O ex‑diretor vive atualmente em Kíev e trabalha como simples escrevente em uma empresa.

Assim termina a história.

Talvez “Hotel Mariana” não ganhe o Nobel, nem o Shell ou seja contemplado em outros prêmios e festivais, mas que é uma das peças mais bonitas, necessárias, urgentes e demonstra o quanto o teatro ainda pode ser arena de debates das questões atuais, isto é.

segunda-feira, 8 de maio de 2017

De sonhos e erros

Meus sonhos estão maravilhosos esses dias.

De sexta para sábado eu sonhei que ia na redação do Omelete. Faz um tempo já que vendo os vídeos no stories do instagram, dá muita vontade de trabalhar lá.

Parece um lugar legal e descontraído. Deve-se trabalhar muito e talvez seja preciso desapegar dessa mania de não gostar de spoilers.

O salário talvez seja legal, talvez não. Mas sempre rolam uns jabás e oportunidades de visitar o set de uns blockbusters ruins e esquecíveis - o que deve ser ótimo tanto para sair do marasmo da rotina conhecendo o mundo como para praticar o inglês.

No sonho, por algum motivo o Mauricio tinha algo para entregar lá e eu o acompanhava. Enquanto ele fazia o que precisava ser feito eu trocava uma ideia com o pessoal.

Mas acabei queimando meu filme ao narrar minha própria trajetória de maneira tragicômica. As pessoas, como não me conheciam, acabaram por levar a sério todo meu humor autodepreciativo e acabei tomando um puxão de orelha da Nathalia Arcuri.

Por boa parte do resto do sonho e até ao acordar, fiquei lamentando ter queimado a chance de trabalhar no Omelete. Levantei achando que aquilo tinha acontecido. "Acabei com todas as minhas oportunidades".

Nesta noite eu sonhei que ia fazer com a Raíra um curso de biscuit, ministrado por ninguém mais ninguém menos que Adriane Galisteu. Foi bem maluco. A Galisteu fazia uma participação bem curta no sonho. Apenas aparecendo na aula e chamando a turma para ir almoçar em um restaurante que ficava a algumas quadras de onde era oferecido o curso.

Almoçamos e descobrimos que a Galisteu teve algum tipo de contratempo, então o curso de biscuit seria dado pelo Miguel Falabella. Mas ele não ensinou ninguém a fazer biscuit no final das contas. Ele ficava falando sobre ele e no final das contas só sobrou eu, ele e uma assessora, pra fechar a sala.

Quando o Miguel Falabella estava colocando o capacete e subindo em sua moto para ir embora, acabei tomando coragem para pedir para ele me dar uma entrevista. Ele desconversou, mas depois que falei para ele, que já tinha o entrevistado uma vez, ele foi um pouco mais receptivo. Disse que responderia algumas perguntas por e-mail, mas não me passou o e-mail.

No final íamos embora juntos, meio a pé meio em alta velocidade, por um caminho que parecia ser a avenida Nove de Julho. Ele evitava um assalto no ponto de um ônibus dando dois reais a um assaltante e no final sua assessora acabava se machucando em uma grade e quase apanhou iniciando uma discussão sobre racismo.

Hoje eu tentei fazer a torta de cebola caramelizada da Bela Gil. Tinha comprado cebola e farinha de grão de bico na semana passada. Deu mais ou menos certo. A massa rachou, que ficou parecendo solo erodido.

A quantidade dos ingredientes da receita para a massa era pouca para o tamanho da forma que eu tenho em casa. Tive que fazer mais massa para a lateral da torta. Em compensação consegui pela primeira vez na vida acertar o ponto da cebola caramelizada. A torta não ficou incrível e formosa, mas dá para comer.

O legal de ter "errado" a torta, é aprender com o erro e ver que preciso mudar a quantidade de farinha, água e azeite da próxima vez. Talvez até fugir do conceito vegano e usar um ovo para dar liga, como numa massa de quiche convencional. Enfim. Acho que por hoje é só.


sexta-feira, 5 de maio de 2017

Projeções

Maio começou com um feriado, trazendo também as férias.

Férias que quanto tempo eu não tinha. Férias remuneradas, de trinta dias. Vamos aproveitar, porque vai que deixa de existir.

Além disso, eu também estava precisando. De um tempo, sabe? Pra pensar na vida.

O primeiro dia oficial das férias foi na terça. Então na segunda eu tentei fazer uma espécie de retiro caseiro do silêncio.

Inspirado por um livro que eu tava lendo, decidi me dedicar ao silêncio meditativo e contemplativo.

Tive que quebra-lo por motivos de força maior. Teve uma apresentação do Grupo Galpão aqui do lado de casa. E a não ser por uma vez ou outra que falei comigo em voz alta e na hora de falar para a mocinha do mercadinho passar as compras no débito eu não fiz nada, e também não falei nada.

Aliás. Nada fazer é algo que eu estou tão desabituado, que confesso que foi difícil. Minha pilha de livros e gibis está gigante. Assim como as séries e filmes para ver. Há muitas coisas com as quais ocupar os tempos livres.

Pois bem. Um dos projetos das férias era: assistir um filme por dia, ouvir um disco por dia e terminar algumas séries como a sexta temporada de “Glee”, pra me livrar logo desse carma, e a terceira temporada de “O Negócio”.

Já estou no quarto dia e nem tudo deu. Estou um pouco mais adiantado em “O Negócio”. Hoje a internet está meio embaçada então não consegui ver nada do que tenho na lista infinita da Netflix. O que me faz pensar: ao mesmo tempo em que a Netflix é maravilhosa, cria uma dependência, né?

Com a internet sem funcionar muito bem, vagou uma janela na minha programação de “ver coisas” e daí pensei. Fazer o quê com o tempo livre, não é mesmo? Daí que a tarde eu li. E vim então escrever esse post.

Eu podia trabalhar na edição do podcast, mas a internet e a dor nas costas complicam. Poderia então trabalhar no livro. Sim, porque né. Acho tão pretensioso dizer que eu estou escrevendo um livro.

Esses dias consegui trabalhar nele. Na verdade, passar a limpo e incrementar dois capítulos escritos em março (!!!). E também comecei mais um. Aquele sonho romântico de passar o dia inteiro escrevendo ou pelo menos quatro horas seguidas, ainda não aconteceu.

Fazendo um mea culpa, me faltou disciplina na, haha, primeira semana das férias. Semana que vem, tento compensar isso. Prometo. O problema é que nada do que eu tenho escrito eu acho bom. Tudo parece horroroso e aí é uma luta. Porque eu fico o tempo todo dizendo para mim mesmo que tá tudo uma bosta, que ninguém vai ler, que ninguém vai comprar, que ninguém vai se interessar por isso, que não é criativo, que não é ousado, que a estrutura é fraca, que não tem conflito, que eu nunca vou me sentar no panteão dos grandes escritores brasileiros,  que tem muito sexo, imagina sua mãe, sua vó e suas tias lendo isso. Como seus parentes vão conversar com você no churrasco, você nunca mais vai ser convidado para uma festinha na vida.

Sobre os discos, consegui ouvir o novo do Criolo, o novo do Gorillaz e um que eu esqueci o nome do Hercules & Love Affair. Gostei muito do primeiro. O segundo achei chato, boring, sem nenhum grande hit, nada  que fique na cabeça como des pa ci to e o terceiro também não virei fã não.