quinta-feira, 23 de março de 2023

Custa muito caro ser uma bicha inteligente

Comecei a ler "Retorno a Reims" porque eu precisava ler uma coisa gay depois de toda a heterossexualidade sufocante de Via Ápia. Queria mesmo ter começado o "Johnny, Você me Amaria se o Meu Fosse Maior?", mas quem disse que achei o livro?

Então peguei o livro do Didier Eribon, que eu fico chamando na minha cabeça de Didididier e que delícia.

Tem uma sofisticação e uma racionalidade na escrita. Uma coisa entre o filosófico e o sociológico (ele é sociólogo). Uma mistura de Annie Ernaux e Édouard Louis. Enquanto com Édouard você apanha na cara e leva umas cusparadas junto com ele, a Ernaux se aproxima, mas também mantém um afastamento.

Pelo menos foi a minha impressão de "O Lugar". Mas "Retorno" é diferente, até um pouco frio e distante.

"Retorno" fala de um tema que me toca muito. O distanciamento que se faz necessário da família e tudo que aquilo que ela traz quando se é gay. A busca pela formação da nossa identidade e da nossa formação subjetiva passa longe desse modelo em que o acolhimento é falho e as referências não nos cabem.

Em Ernaux o distanciamento acontece com o acesso ao ensino superior. Os ditames da classe são rompidos, mas as questões e gênero estão lá.

No Didididier a escrita é mais reflexiva. Tem muitas referências. Vou ter que enfim pegar "Notas de Um Filho Nativo", do James Baldwin por causa dele.

Tem também que ele escreveu "Reflexões Sobre a Questão Gay", uma biografia do Foucault. E eu tenho namorado o Foucault há um tempo. O livro foi publicado por aqui em 1999, quando eu tinha apenas 12 aninhos. Hoje ele está mais de R$ 300 no Estante Virtual.

Custa muito caro ser uma bicha inteligente.